STJ nega liminar que tenta impedir troca de VLT por BRT em Mato Grosso 3h5s15

Composições do VLT sem funcionar

Para presidente do Superior Tribunal de Justiça, prefeitura não conseguiu provar prejuízos e irregularidades com a troca de meio de transporte

ADAMO BAZANI

Colaborou Willian Moreira

O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Humberto Martins, em plantão, negou neste sábado, 02 de janeiro de 2021, pedido de liminar movido pela prefeitura de Cuiabá para obrigar o Estado de Mato Grosso a parar o processo de troca do projeto de VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) para BRT (Bus Rapid Transit) entre a capital e a cidade de Várzea Grande.

O meio de transporte entre os dois municípios é cercado de polêmica e deveria estar em operação antes da Copa do Mundo de 2014. O projeto original era mesmo o sistema de ônibus rápidos, mas foi trocado por um sistema de trens leves, o que gerou desconfiança do Ministério Público, resultando na Operação Descarrilho, que apontou fraudes na troca de opção em prol do VLT. Em dezembro de 2020, o governo do Estado anunciou a retomada da proposta de BRT (Veja o histórico completo abaixo)

A prefeitura de Cuiabá alegou no processo que o governo do Estado, não permitiu que as prefeituras particiem da escolha.

Na decisão de 02 de janeiro de 2021, o ministro Humberto Martins afastou as argumentações da prefeitura apontando que a capital não foi capaz de provar irregularidades na escolha pelo BRT, não havendo necessidade de uma decisão liminar.

“Não há fumaça do bom direito, como também não está configurado perigo da demora, porquanto não foram colacionados aos autos provas inequívocas pré-constituídas da existência concreta do ato coator, que seria, segundo alega, possível autorização do Ministério do Desenvolvimento acerca de um início de procedimento licitatório que poderia, ao final, eventualmente levar à substituição da política pública escolhida”,

A prefeitura de Cuiabá solicitou ainda que o STJ determinasse ao Ministério do Desenvolvimento Regional a abstenção da prática de qualquer ato istrativo que autorize a continuidade do processo de alteração da opção de transporte coletivo urbano intermunicipal em Mato Grosso ou qualquer decisão a respeito desse tema sem a participação e sem o compartilhamento de informações com os municípios integrantes da Região Metropolitana do Vale do Rio Cuiabá.

Mas ao negar o mandado de segurança da prefeitura da capital, o presidente do STJ ressaltou que o município, no caso, “apenas supõe que o governo do Estado do Mato Grosso poderá realizar a mudança da política pública escolhida, referente ao transporte público intermunicipal, de construção do Veículo Leve sobre trilhos – VLT, ando a adotar, em sua substituição, o BUS RAPID TRANSIT – BRT, colacionando tão somente notícias da imprensa para fins de demonstração de que o procedimento licitatório para tal fim poderá ser iniciado, provavelmente, no início de 2021”.

De acordo com nota da assessoria de imprensa do STJ, Humberto Martins enfatizou que o mandado de segurança não pode ser concedido com base “num suposto ato que poderá no futuro ser realizado”. Para o ministro, no caso, “vê-se que não está comprovado qualquer ato coator concreto corrigível pela via do mandado de segurança. E, diante da ausência da prova pré-constituída do suposto ato coator, vê-se a ausência inequívoca de qualquer direito líquido e certo nesse momento apto a justificar a propositura da presente ação constitucional”.

Martins destacou, no entanto, que “posteriormente, diante de um ato concreto, possa haver a devida impugnação judicial”.

O presidente do STJ ordenou, ainda, a notificação ao Ministério do Desenvolvimento Regional  para que preste informações no prazo de dez dias, e determinou ciência à Advocacia-Geral da União para que, havendo interesse, ingresse no processo.

Após esses procedimentos, o mandado de segurança segue para análise pelo Ministério Público Federal, antes do julgamento do mérito, sob a relatoria da ministra Assusete Magalhães.

HISTÓRICO:

(Adamo Bazani)

Como mostrou o Diário do Transporte, em 21 de dezembro de 2020, o governador do Mato Grosso, Mauro Mendes anunciou a troca do VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) por um BRT (Bus Rapid Transit), sistema de corredores com maior velocidade e capacidade que corredores comuns, para a ligação entre os municípios de Cuiabá e Várzea Grande

O meio de transportes sobre trilhos deveria ter sido entregue antes da Copa do Mundo de Futebol de 2014, mas não era a modalidade original definida para o trajeto.

A proposta original era de um BRT, mas foi trocada pelo VLT o que, na ocasião, levantou suspeitas de direcionamento e corrupção pelo fato de a obra e o sistema do Veículo Leve sobre Trilhos serem mais caros com capacidade de ageiros semelhantes (veja mais abaixo).

Segundo a istração estadual, a decisão em pedir a substituição levou em conta estudos técnicos elaborados pelo Governo de Mato Grosso e pelo Grupo Técnico criado na Secretaria Nacional de Mobilidade Urbana. Os estudos concluíram que a continuidade das obras do VLT era “insustentável”, demoraria até seis anos para conclusão, custosa aos cofres públicos, com pouca vantagem à população e ainda contaria com uma tarifa muito alta.

Conforme o relatório, as irregularidades no contrato do VLT existem desde a fase de licitação e resultaram em várias ações judiciais em andamento. A situação piorou após a delação do ex-governador Silval Barbosa, que confessou vários crimes ligados a esta obra, envolvendo recebimento de propinas milionárias para a escolha do modal, além de pagamentos superfaturados. Com a rescisão do contrato, as empresas que integram o consórcio ainda foram declaradas “inidôneas para contratar com o Poder Público”.

Os investimentos para o VLT até dezembro de 2020 foram de mais de R$ 1 bilhão.

Mesmo assim, segundo o governo estadual, com base em estudo técnico com mais de 1,4 mil páginas, é mais vantajoso o engavetamento do VLT.

O BRT terá um custo total de R$ 430 milhões para ser implantado e o VLT poderia chegar a R$ 763 milhões para a finalização.

Além disso, segundo o estudo apresentado pelo governo do estado, atualmente, o custo por ageiro do BRT seria de R$ 3,04, enquanto seriam necessários R$ 5,28 para o VLT fazer o mesmo transporte.

Não seria a tarifa final, já que os valores só levam em conta a operação do BRT ou do VLT sem a integração com os ônibus comuns.

Ainda de acordo com o governo do Estado, o tempo de implantação do BRT será de 24 meses e do VLT de 48 meses a partir de 2021.

O governador prometeu que o edital de  RDC (Regime Diferenciado de Contratações) para o BRT vai ser lançado até maio de 2021 com conclusão em dois anos.

O BRT terá 54 ônibus elétricos articulados.

“Este ônibus terá piso baixo e é feito no Brasil. O design é arrojado, moderno. São José dos Campos, em São Paulo, já encomendou. este veículo é montado em Campinas, também em São Paulo” – disse

A velocidade do BRT será maior que o VLT, segundo o estudo: 25,02 km/h (BRT) x 21,3 km (VLT).

A capacidade do BRT será maior também ainda de acordo com a apresentação: 155.181 ageiros por dia no BRT e 118.185 ageiros por dia no VLT

“Olhando um BRT e um VLT, a impressão que tem é que o trem transporta mais. Porém, isso é um engano. O BRT tem uma flexibilidade de rotas, de linhas alimentadoras e permite a criação de linhas expressas e semi-expressas, isso aumenta sua capacidade e velocidade. É simples” – disse o governador

O projeto original na matriz da Copa do Mundo de 2014 para ligar Várzea Grande e Cuiabá seria mesmo um BRT, lembrou Mendes.

Mas, houve a troca repentina pelo VLT, o que fez o Ministério Público fazer uma série de questionamentos.

“Foi uma troca mal explicada, que teve suspeitas de fraudes, comprovadas. Nossa decisão é técnica e a melhor solução é mudar de novo para o BRT, tanto em curto prazo como médio prazo” – disse.

Entidades do setor de trilhos criticaram:

Em entrevista ao Diário do Transporte, em 22 de dezembro de 2020, o diretor do SIMEFRE (Sindicato Interestadual de Materiais e Equipamentos Ferroviários e Rodoviários) e presidente da ABIFER (Associação Brasileira da Indústria Ferroviária), Vicente Abate, contestou a opção pelo BRT.

Segundo Abate, as entidades pediram uma audiência ao Governador do MT no dia 13 de outubro deste ano. “Pedimos e cobramos três vezes, e não obtivemos resposta”, ele conta (veja cópia da carta no fim da matéria).

O objetivo do encontro seria apresentar ao Governador a posição de especialistas do setor sobre as possibilidades de retomada do VLT de Cuiabá.

Foram dois meses sem resposta ao nosso pedido de audiência, o que nos leva a deduzir que ele tenha tomado essa decisão sem falar com a sociedade, sem falar com especialistas”, disse.

O executivo criticou principalmente o relatório apresentado na coletiva do governador em 21 de dezembro de 2020, utilizado para justificar a descontinuidade do VLT e a opção pelo BRT.

É um relatório vergonhoso. Se eu tivesse escrito algo daquela natureza, eu teria vergonha de apresentar em público”, afirmou

Vicente Abate afirma que a maioria das comparações feitas no relatório apontam “com erros grosseiros” o que, segundo o Governo do MT, seriam as vantagens da opção do BRT sobre o VLT.

Relembre:

/2020/12/22/entidades-do-setor-de-trilhos-contestam-opcao-pelo-brt-no-lugar-do-vlt-no-mato-grosso/

Suspeitas desde a época da Copa:

As obras foram paralisadas em  2014, quando o governador ainda era Silval Barbosa, e o modal estava previsto para ser entregue até a Copa do Mundo.

Inicialmente o projeto era de BRT, que custaria menos da metade.

Foi cogitada até mesmo uma possível fraude do Ministério das Cidades para a implantação de um VLT – Veículo Leve sobre Trilhos. A PF – Polícia Federal diz que houve irregularidades.

Com verbas de R$ 500 milhões já liberadas, na ocasião, para a construção de um corredor de ônibus rápido, BRT – Bus Rapid Transit, o Governo do Mato Grosso decidiu trocar o sistema de transportes para VLT.

Com isso, as obras para atender o mesmo trajeto subiriam de R$ 500 milhões para R$ 1,2 bilhão, uma diferença de gastos de R$ 700 milhões a mais.

A alegação do Governo do Estado para o Ministério das Cidades na época era que o VLT transportaria mais pessoas e mais rapidamente.

Mas o estudo técnico para convencer o Governo Federal a financiar o modal sobre trilhos teria sido adulterado, o que prejudicou a comparação de fato entre os dois modais, de acordo com as investigações do Ministério Público.

Operação Descarrilho:

Em agosto de 2017, a operação “Descarrilho”, da Polícia Federal, revelou esquemas de corrupção no processo licitatório e implantação da obra do VLT.

]Com isso, o governador Pedro Taques decidiu rescindir o contrato com o Consórcio VLT-Cuiabá/Várzea Grande, formado pela CR Almeida, CAF, Santa Barbara e Magna.

Antes da operação da Polícia Federal, Taques chegou a cogitar o pagamento de R$ 922 milhões para o consórcio retomar as obras.

De acordo com a Polícia Federal, ocorreu um superfaturamento superior a R$ 120 milhões para a compra dos trens, fruto do RDC – Regime Diferenciado de Contratações, que tem regras mais “flexíveis” que as previstas pela “lei de licitações” 8666/93. O RDC foi usado em várias obras para a Copa em diversas partes do país.

No dia 06 de junho de 2019, em segunda instância, o TJMT – Tribunal de Justiça de Mato Grosso negou recurso contra a rescisão do contrato, movido pelo consórcio da CR Almeida, CAF, Santa Barbara e Magna.

Volta da opção BRT tem respaldo jurídico, defende procurador

Por meio de nota, em 24 de dezembro de 2020, o procurador-geral do Estado, Francisco Lopes, disse que do ponto jurídico, a troca de opção de transportes a ser implantada é possível porque o contrato com o Consórcio VLT foi rescindido em 2017.

Além disso, de acordo com o procurador, em 2019, a rescisão contratual foi confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT).

Lopes disse ainda que sob o olhar jurídico, a questão do VLT pode ser considerada “página virada”.

“Essa página já foi virada. Buscamos na legislação – na Lei das Licitações, na Lei de Improbidade istrativa, na Lei Anticorrupção e no próprio Código Civil – quais as consequências que deram causa à rescisão contratual, e elas são muito claras no que diz respeito ao que acontece quando uma das partes descumpre o contrato. Foi com base nessas premissas que orientamos a ação judicial e o pedido para a substituição do modal”, destacou o procurador-geral, durante reunião com deputados estaduais, em 23 de dezembro de 2020, no Palácio Paiaguás, cuja fala foi reproduzida na nota oficial do governo à imprensa no dia 24.

O procurador ainda disse que acredita que o Estado saia vencedor na ação judicial na qual pede, além do ressarcimento, indenização no valor total de R$ 830 milhões, contra o Consórcio VLT e as cinco empresas que o compõem: CR Almeida, CAF Brasil, Santa Bárbara Construções, Magna Engenharia e Astep Engenharia.

“Estamos seguros em dar continuidade a essas ações, tanto de substituição do modal de transporte entre Cuiabá e Várzea Grande, quanto de indenização e ressarcimento, pois a fundamentação jurídica de ambas está baseada nas premissas legais de legislação e decisões judiciais”, finalizou o procurador-geral do Estado.

Lopes, entretanto, afirmou que as empresas podem recorrer, “pois essa manifestação é livre a qualquer pessoa jurídica ou física”, no entanto, considerou difícil um revés jurídico, já que a decisão foi fundamentada nas legislações vigentes anticorrupção e de improbidade istrativa.

O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Humberto Martins, em plantão, negou em 02 de janeiro de 2021, pedido de liminar movido pela prefeitura de Cuiabá para obrigar o Estado de Mato Grosso a parar o processo de troca do projeto de VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) para BRT (Bus Rapid Transit) entre a capital e a cidade de Várzea Grande.

O meio de transporte entre os dois municípios é cercado de polêmica e deveria estar em operação antes da Copa do Mundo de 2014. O projeto original era mesmo o sistema de ônibus rápidos, mas foi trocado por um sistema de trens leves, o que gerou desconfiança do Ministério Público, resultando na Operação Descarrilho, que apontou fraudes na troca de opção em prol do VLT. Em dezembro de 2020, o governo do Estado anunciou a retomada da proposta de BRT (Veja o histórico completo abaixo)

A prefeitura de Cuiabá alegou no processo que o governo do Estado, não permitiu que as prefeituras particiem da escolha.

Na decisão de 02 de janeiro de 2021, o ministro Humberto Martins afastou as argumentações da prefeitura apontando que a capital não foi capaz de provar irregularidades na escolha pelo BRT, não havendo necessidade de uma decisão liminar.

“Não há fumaça do bom direito, como também não está configurado perigo da demora, porquanto não foram colacionados aos autos provas inequívocas pré-constituídas da existência concreta do ato coator, que seria, segundo alega, possível autorização do Ministério do Desenvolvimento acerca de um início de procedimento licitatório que poderia, ao final, eventualmente levar à substituição da política pública escolhida”,

A prefeitura de Cuiabá solicitou ainda que o STJ determinasse ao Ministério do Desenvolvimento Regional a abstenção da prática de qualquer ato istrativo que autorize a continuidade do processo de alteração da opção de transporte coletivo urbano intermunicipal em Mato Grosso ou qualquer decisão a respeito desse tema sem a participação e sem o compartilhamento de informações com os municípios integrantes da Região Metropolitana do Vale do Rio Cuiabá.

Mas ao negar o mandado de segurança da prefeitura da capital, o presidente do STJ ressaltou que o município, no caso, “apenas supõe que o governo do Estado do Mato Grosso poderá realizar a mudança da política pública escolhida, referente ao transporte público intermunicipal, de construção do Veículo Leve sobre trilhos – VLT, ando a adotar, em sua substituição, o BUS RAPID TRANSIT – BRT, colacionando tão somente notícias da imprensa para fins de demonstração de que o procedimento licitatório para tal fim poderá ser iniciado, provavelmente, no início de 2021”.

De acordo com nota da assessoria de imprensa do STJ, Humberto Martins enfatizou que o mandado de segurança não pode ser concedido com base “num suposto ato que poderá no futuro ser realizado”. Para o ministro, no caso, “vê-se que não está comprovado qualquer ato coator concreto corrigível pela via do mandado de segurança. E, diante da ausência da prova pré-constituída do suposto ato coator, vê-se a ausência inequívoca de qualquer direito líquido e certo nesse momento apto a justificar a propositura da presente ação constitucional”.

Martins destacou, no entanto, que “posteriormente, diante de um ato concreto, possa haver a devida impugnação judicial”.

O presidente do STJ ordenou, ainda, a notificação ao Ministério do Desenvolvimento Regional  para que preste informações no prazo de dez dias, e determinou ciência à Advocacia-Geral da União para que, havendo interesse, ingresse no processo.

Após esses procedimentos, o mandado de segurança segue para análise pelo Ministério Público Federal, antes do julgamento do mérito, sob a relatoria da ministra Assusete Magalhães.

Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes 

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