Prefeituras do ABC tentaram adotar a mesma prática e foram derrotadas nos tribunais. Cabem recursos
ADAMO BAZANI
Uma das informações que chamaram a atenção no reajuste da tarifa de ônibus da cidade de São Paulo anunciado pela gestão Bruno Covas é que o Vale-Transporte, pago pelas empresas aos funcionários com desconto de 6% na folha de pagamento, vai custar mais caro que a agem para os demais usuários.
Enquanto a tarifa comum de ônibus será de R$ 4,30 a partir de 07 de janeiro de 2019, o VT custará por deslocamento R$ 4,57, 30 dias depois do reajuste, ou seja, em 07 de fevereiro de 2019.
O valor é inferior à tarifa integrada com o Metrô ou a TM, que ará a ser de R$ 7,21, mas superior às quatro integrações possíveis entre os ônibus municipais em três horas, que sairão por R$ 4,30, o mesmo valor de uma única viagem, como já é atualmente, mas custando R$ 4.
As integrações pelo Vale-Transporte eram subsidiadas pela prefeitura de São Paulo que nesta sexta-feira, em nota, informou que vai acabar com as complementações.
A istração municipal decidiu manter a política de subsídio apenas para o ageiro, para promover a inclusão no transporte coletivo. As gratuidades para idosos, estudantes e pessoas com deficiência serão mantidas. Diariamente, 9,5 milhões de ageiros utilizam os 14 mil ônibus que circulam pela cidade.
O vale-transporte para as empresas deixará de ser subsidiado pelos impostos municipais pagos pela população. O valor a ser pago pelo empregador ará a ser de R$ 4,57. O fim do subsídio alcança apenas as empresas. Para o trabalhador, o desconto de 6% em folha, conforme define a Legislação Trabalhista, não sofrerá alteração.
Ocorre que prefeituras do ABC Paulista tentam também cobrar de forma diferenciada o Vale-Transporte, mas todas as vezes que foram contestadas na Justiça, amargaram derrotas e tiveram de igualar o VT à tarifa comum.
Há ações judiciais em Santo André e São Bernardo do Campo que deram ganhos de causa a entidades de empresários e comerciantes.
Alguns juízes entenderam que a cobrança diferenciada, mesmo com o argumento das integrações, é ilegal porque contraria a lei federal de 1985, que instituiu o Vale-Transporte.
Numa das decisões contra a prática do prefeito de São Bernardo do Campo, Orlando Morando, por exemplo, em novembro deste ano, a juíza Ida Inês Del Cid, da 2ª Vara da Fazenda Pública de São Bernardo do Campo, escreveu que diferenciar o valor da tarifa comum da tarifa de vale-transporte “viola a REGRA GERAL estampada no artigo 5º da Lei Federal nº 7.418/85 que institui o vale-transporte segundo a qual a empresa operadora do sistema de transporte coletivo público é obrigada a emitir e a comercializar o vale-transporte, ao preço da tarifa vigente, colocando-o à disposição dos empregadores em geral e assumindo os custos dessa obrigação, sem reá-los para a tarifa dos serviços. Desta forma, conforme disposição cogente da norma federal de regência do benefício do vale-transporte o valor do referido benefício deve ser igual ao da tarifa vigente. Significa dizer que a legislação federal, de forma expressa, veda a imposição de qualquer gravame aos usuários de vale-transporte, que devem receber tratamento idêntico ao dispensado ao usuário comum. Nada mais natural, pois, se o serviço é o mesmo.”
As prefeituras do ABC também argumentaram que o valor maior era para subsidiar as integrações, que em Santo André e em São Bernardo do Campo, têm prazo menor e menos possibilidades de trocas de ônibus como ocorre na cidade de São Paulo.
Ao negar um recurso do prefeito Paulo Serra, de Santo André, em maio deste ano, o desembargador relator Pereira Calças, do Órgão Especial do TJ – Tribunal de Justiça de São Paulo, entendeu que não tem base legal o argumento das prefeituras que diz que o VT mais caro que a tarifa comum ainda é mais vantajoso para os empregadores do que se não houvesse integração e os patrões tivessem de pagar duas ou mais tarifas cheias.
Nem socorre a Municipalidade o argumento de que os empregadores aderentes ao programa de vale-transporte já teriam sido beneficiados pela instituição do Bilhete Único, por benefícios tributários em matéria de imposto de renda e de contribuição social sobre o lucro líquido, etc. Essas supostas vantagens não têm o condão de afastar a incidência do dispositivo legal acima transcrito.
Em São Bernardo do Campo, o Vale-Transporte foi estipulado em R$ 4,75 enquanto a tarifa comum é de R$ 4,40. Já em Santo André, a tarifa é de R$ 4,40, mas o VT foi estipulado em R$ 5,50.
No ABC, as prefeituras, que desde 2015 vêm tentando esta prática, fazem a seguinte manobra: estipulam o valor da tarifa-básica pelo valor máximo do VT e depois, no mesmo decreto das tarifas, dão supostos descontos sobre as agens pagas com o bilhete único comum de cada cidade ou em dinheiro.
A artimanha é para tentar enquadrar o valor diferenciado na lei que determina que o VT seja do mesmo valor da tarifa vigente oficial, mas a manobra jurídica não tem sido aceita pelos tribunais.
No caso da capital paulista, ainda nenhuma entidade empresarial ou de comerciantes se manifestou oficialmente, mas o princípio é semelhante e pode haver disputas judiciais.
Relembre algumas decisões que derrubaram o Vale-Transporte mais caro que a tarifa comum:
– 13 de novembro de 2018:
Mais uma decisão da Justiça diz que vale-transporte mais caro que tarifa comum em São Bernardo do Campo é ilegal:
– 05 de novembro de 2018:
Justiça decreta ilegal vale-transporte a R$ 4,75 em São Bernardo do Campo, mais caro que a tarifa comum
– 23 de outubro de 2018:
Mais uma entidade empresarial derruba vale-transporte a R$ 5,50 em Santo André
/2018/10/23/mais-uma-entidade-empresarial-derruba-vale-transporte-a-r-550-em-santo-andre/
– 17 de maio de 2018:
Justiça nega em segunda instância recurso da prefeitura de Santo André e vale-transporte mais caro que a tarifa comum continua suspenso
– 27 de abril de 2018:
Justiça derruba vale-transporte mais caro para empresas associadas à ACISA, em Santo André
Em todos estes casos, as prefeituras podem recorrer das decisões.
PREFEITURA DE SÃO PAULO DIZ QUE MEDIDA É LEGAL:
Em nota ao Diário do Transporte, a prefeitura de São Paulo diz que a PGM – Procuradoria Geral do Município estou a cobrança diferenciada e que a prática tem respaldo legal:
A Procuradoria Geral do Município estudou a questão e sustenta a legalidade da proposta. A medida atende ao princípio da supremacia do interesse público pois não é correto que recursos do tesouro municipal arquem com custos que são legalmente de responsabilidade das empresas.
Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes