Agora foram R$ 110 milhões. No início do mês ado, foram R$ 192 milhões. Outros remanejamentos podem ser feitos
ADAMO BAZANI
Principal bandeira de marketing atual da prefeitura de São Paulo, o programa Asfalto Novo mais uma vez recebeu recursos milionários de investimentos que deveriam melhorar a qualidade e a velocidade do transporte coletivo na cidade.
No Diário Oficial deste sábado, 24 de março de 2018, o prefeito João Doria publicou o decreto número 58.161, que retira R$ 110 milhões (R$ 110.202.414,58) de construção e qualificação de corredores de ônibus para a pavimentação e recapeamento.
Não é a primeira vez que Doria faz este tipo de remanejamento.
Conforme noticiou o Diário do Transporte, em 23 de fevereiro, a gestão Doria já havia retirado R$ 192 milhões (R$ 192.227.832,59) dos corredores de ônibus e destinou para o asfalto de vias de tráfego comum.
Na ocasião, a SPTrans – São Paulo Transporte, gerenciadora do sistema da mobilidade da cidade, disse por meio de nota que os remanejamentos são permitidos por lei e que seguem as “prioridades” da gestão. A gerenciadora dos transportes ainda afirmou que não haverá prejuízos às estimativas de novos corredores, que vão contar com recursos do fundo do trânsito.
“A SPTrans informa que as alterações são definidas pelas prioridades da gestão. O remanejamento orçamentário é permitido por lei, no limite de 9% do seu total.
Esta alteração não acarreta qualquer prejuízo à implantação de corredores na cidade. O orçamento para este fim está mantido, proveniente do Fundo Municipal de Desenvolvimento de Trânsito (FMDT).”
A cidade possui em torno de 130 quilômetros de corredores de ônibus, sendo que apenas oito quilômetros são de BRT – Bus Rapid Transit, o Expresso Tiradentes, que desde 5 de fevereiro está com um trecho de 300 metros interditado, entre a rua Dona Ana Néri e o Terminal Parque Dom Pedro II, devido ao afundamento da pista. – Relembre: /2018/02/06/trecho-do-expresso-tiradentes-afunda-e-prefeitura-interdita-300-metros/
TRANSPORTE COLETIVO EM DESVANTAGEM NA CIDADE DE SÃO PAULO:
Um estudo de 2012, encomendado pela própria prefeitura de São Paulo, mostrava que na ocasião, a cidade deveria ter ao menos 600 quilômetros de corredores de ônibus para que a velocidade do sistema fosse satisfatória e para que o atendimento ao ageiro fosse melhorado.
Em última análise, com as transferências mais uma vez de recursos milionários de corredores de ônibus para asfaltamento e recapeamento, a gestão Doria dá mais prioridade ao transporte individual que ao coletivo.
A prática é um contrassenso frente a dados oficiais e a resultados de estudos feitos por institutos de credibilidade.
Inventário de Emissões Atmosféricas do Transporte Rodoviário de ageiros no Município de São Paulo, lançado em 23 de maio do ano ado, pelo Instituto de Energia e Meio Ambiente – Iema, revela, com base na Pesquisa Origem – Destino do Metrô, que os carros transportam apenas 30% das pessoas na cidade, mas ocupam 88% do espaço das vias. Os ônibus municipais, por sua vez, transportam 40% dos cidadãos, mas só ocupam 3% das vias.
Assim, mesmo que os ônibus também em pelas vias contempladas pelo “Asfalto Novo” de Doria, devido a esta distribuição, com o remanejamento de dinheiro de corredores para recapeamento de ruas e avenidas comuns, quem se beneficia é o transporte individual, que atende a menos pessoas e ocupa mais espaço na cidade.
O privilégio ao carro na cidade também causa doenças, com impactos na saúde pública por causa da poluição.
Ainda de acordo com o estudo do Iema, os carros de eio transportam apenas 30% das pessoas em São Paulo, mas são responsáveis por 72,6% das emissões de gases de efeito estufa do setor de transportes.
Já os ônibus municipais, de acordo com a pesquisa de Origem e Destino, transportam em média 40% das pessoas que se deslocam pela cidade, mas são responsáveis apenas por 3,1% das emissões na capital paulista (isso com a tecnologia Euro III de motores predominante, cerca da metade da frota atual de ônibus é Euro V, que polui menos).
Levando em consideração as emissões por ageiro por quilômetro, os carros e motos continuam sendo os campeões de poluição. Os carros emitem 65,8% de dióxido de carbono, as motocicletas são responsáveis por 35,6% e os ônibus municipais lançam no ar 17%.
Relembre:
ASFALTO NOVO COM MAIS DINHEIRO QUE PARA O COMBATE À ENCHENTE E ATÉ AGORA, NADA DE ESPAÇOS NOVOS PARA ÔNIBUS:
Na semana em que a cidade de São Paulo se viu paralisada e marcada por tragédias por causa da forte chuva da terça-feira, 20 de março de 2018, o jornal Folha de São Paulo mostrou que a gestão Doria usou mais recursos para o “Asfalto Novo” que para combate às enchentes.
Três pessoas morreram por causa da chuva da última terça-feira: Victoriana Moreno Leão, de 85 anos, no bairro do Limão, na zona Norte; Sofia Gomes Soares, de 1 ano e 8 meses, na Água Branca, na zona Oeste; e o vigilante Gerson Xavier Santana, de 43 anos, no Alto de Pinheiros, Zona Oeste de São Paulo.
Segundo a reportagem de Artur Rodrigues e Dhiego Maia, neste ano, Doria já gastou R$ 40 milhões com recapeamento e pavimentação de vias –quatro vezes a quantia destinada para drenagem. No total, foram anunciados R$ 550 milhões para recuperação de 400 km de ruas e avenidas ao longo do ano.
Já para combate às enchentes, do total de R$ 584 milhões reservados para este ano no Orçamento, foram usados até a semana ada, R$ 10 milhões.
A quantia de R$ 550 milhões prevista para asfaltamento supera inclusive a expectativa de investimentos (e não custeio, como salários) nas áreas de saúde (R$ 545 milhões) ou educação (R$ 168 milhões) em 2018, ainda de acordo com a Folha.
Conforme levantamento do Diário do Transporte, com base em decretos oficiais, destes R$ 550 milhões previstos para o Asfalto Novo, até agora, R$ 302 milhões saíram dos corredores de ônibus, que são considerados essenciais para a nova rede tronco-alimentadora de linhas de ônibus proposta pela licitação dos transportes na cidade.
Para os ônibus das linhas troncais (maiores) não deixarem os ageiros nos terminais de bairro esperando muito, precisam ter velocidade operacional e, para isso, não podem ficar presos no trânsito, mesmo em vias com asfalto bom. Pela proposta da licitação, diversas linhas que hoje vêm ao centro da cidade seriam cortadas (seccionamento) nos bairros, de onde o ageiro deve seguir viagem num ônibus troncal.
Em um ano e quatro meses de gestão, Doria ainda não fez nenhuma faixa de ônibus (solução mais simples) e os projetos de corredores ainda não avançaram.
A cidade tem 17 mil quilômetros de vias, sendo que em torno de 500 quilômetros são de faixas de ônibus (cera de 400 quilômetros implantados na gestão anterior de Fernando Haddad) e 132 quilômetros de corredores. O estudo de 2012 da prefeitura aponta como ideal uma malha de 600 quilômetros de corredores, mas o PPA – Plano Plurianual da gestão Doria prevê até 2020, 72 quilômetros de corredores. Relembre:
/2017/07/11/novo-plano-de-metas-mobilidade-onibus/
O Programa Asfalto Novo é um dos principais temas das propagandas da prefeitura em sites, jornais, rádio e horários nobres de TV aberta.
O ritmo de gastos com publicidade é bem maior que a utilização de recursos para combate às enchentes. Em menos de três meses, já foram gastos R$ 24 milhões, do valor de R$ 105 milhões previsto no ano.
Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes